Pescador desde a infância no município de Aimorés, e lutando desde 2015 por um processo indenizatório que seja justo às dezenas de milhares de pessoas atingidas pelo Caso Samarco ao longo da bacia do rio Doce, Benilde Madeira tornou-se um personagem extremamente conhecido exatamente pelo engajamento na luta dos impactados pelo maior desastre ambiental da história do Brasil.
Ontem, Benilde Madeira recebeu o Jornal Folha1 em sua residência, na Barra do Manhuaçu, onde abordou os temas mais polêmicos que envolvem as indenizações e não se furtou a falar sobre o Novel, o AFE, a repactuação e outros temas polêmicos que envolvem a reparação aos atingidos.
Em junho do ano passado, em plena luta pelos atingidos, Benilde passou por momentos muito difíceis: teve Covid, ficou internado 46 dias em Colatina, 13 deles intubado. “Sobrevivi porque Deus quis assim, acho que tinha uma missão a cumprir ainda e estou aqui na luta”, diz Benilde, cuja estadia no hospital foi acompanhada de perto pela esposa Amelinha.
Segue a entrevista com o pescador Benilde Madeira:
Jornal Folha1 – Você é filho da “Tia Laura”, uma pessoa muito conhecida em toda região pelo restaurante especializado em peixes que funcionou décadas em Aimorés. Como foi o impacto da lama da Samarco no restaurante?
Benilde Madeira – Na verdade o impacto começou antes, em 2013, quando uma enchente violenta nos rios Doce e Manhuaçu destruiu completamente o restaurante. Tivemos que fechar para reconstruir tudo aos poucos, quando em 2015 o desastre da Samarco veio e destruiu de vez nosso sonho do reabrir o restaurante “Tia Laura”, com o agravante que perdemos nossa fonte de renda, que era a pesca no rio Doce. Minha mãe faleceu no ano passado, de Covid, sem realizar o sonho de reabrir o “Tia Laura”.
Jornal Folha1 – Como foi o período pós-rompimento da barragem de Mariana, em 2015, que tirou o sustento de tanta gente na bacia do rio Doce?
Benilde Madeira – Imagina o que é milhares de famílias perderem seu meio de sustento da noite para o dia? Ver o rio devastado pela lama? Milhares de toneladas de peixes mortos, fora a devastação das margens com os resíduos da mineração? Uma situação de calamidade que nunca imaginamos ver na bacia do rio Doce.
Jornal Folha1 – Durante os primeiros anos, como ficou o processo de reparação?
Benilde Madeira – Muito inconsistente e demorado. Através de cadastro distribuíram cartões de Auxílio Financeiro Emergencial (AFE) e instituíram o Programa de Indenização Mediada (PIM) que oferecia a quantia irrisória de indenização de R$ 11,2 mil para os diretamente atingidos.
Jornal Folha1 – Neste contexto surgiu em 2020 o Sistema Simplificado de Indenizações (Novel), que acelerou as Indenizações…
Benilde Madeira – Antes do Novel, surgiram várias Comissões de Atingidos na bacia do rio Doce, que se reuniam para discutir o processo de reparação, surgindo daí a ação judicial que acabou em vitória na Justiça Federal e mudou o curso das Indenizações.
Jornal Folha1 – Que balanço você faz hoje do Novel, que perto de completar 2 anos de existência indenizou mais de 60 mil famílias na bacia do rio Doce, com mais de R$ 6 bilhões pagos?
Benilde Madeira – A primeira coisa que devemos considerar, ao falar do Novel, é explicar que este Sistema Simplificado foi idealizado para reparar uma grande injustiça. Existiam várias categorias como pescadores de subsistência, areeiros, artesãos, lavadeiras, pescadores informais e pequenos comerciantes e agricultores, entre outras, que até 2020 estavam invisíveis no processo indenizatório, ou seja, nunca foram reconhecidos como impactados.
O Novel veio exatamente para garantir uma indenização a quem, para a Fundação Renova, não teria sido impactado. Foi uma vitória extraordinária, que aliás, hoje representa quase 80% de todas as Indenizações pagas pela Fundação Renova desde 2015.
Jornal Folha1 – Nas últimas semanas, o Novel tem sofrido muitos ataques, por causa da tal “quitação definitiva” e por causa do AFE. O que ocorre na realidade?
Benilde Madeira – Primeiro é bom esclarecer que a adesão ao Novel era e continua facultativa, ou seja, não é obrigatória e quem quisesse ou ainda deseja pode buscar outro tipo de reparação na Justiça.
Quanto às críticas, elas partem de umas 10 pessoas que sistematicamente usam as redes sociais para semear a discórdia, atacando as Comissões de Atingidos, advogados, chamando até o juiz Mário de Paula de ladrão. Estas pessoas são aquelas que já receberam pelo Novel e, infelizmente, perderam a empatia por aqueles que ainda aguardam a indenização e procuram tumultuar, criar uma situação que pode até comprometer ou no mínimo atrasar as Indenizações.
Sobre o Novel, cito só o exemplo de Aimorés e Baixo Guandu, onde mais de 12 mil famílias foram indenizadas, injetando bem mais de R$ 1 bilhão na economia destas duas cidades. Sem o Novel, estas milhares de pessoas estariam certamente ainda lutando por uma reparação incerta.
Jornal Folha1 – E a relação entre o Novel e o AFE?
Benilde Madeira – São coisas absolutamente distintas. O Novel é uma coisa e o AFE, depende de decisão que nada tem a ver com o Sistema Simplificado.
Jornal Folha1 – O Novel foi um divisor no processo de reparação?
Benilde Madeira – O Novel não é um sistema perfeito, mas tem sido aprimorado pela própria Justiça Federal. Existem defeitos nele? Claro que sim, um deles é que os cadastros feitos depois de 2018, a chamada fase 2, podem incluir seus dependentes conforme sentença, onde no ato da inserção na plataforma online estes declaram seus danos (visto que não foi possibilitado a este atingido ser entrevistado e catalogado por uma empresa contratada pela Fundação Renova).
Ou seja, os cadastros mais recentes, de 2018 até abril de 2020 conseguem incluir dependentes, enquanto os mais antigos enfrentam dificuldades neste sentido, pois os danos estão atrelados às entrevistas /formulários realizados em 2016 e 2017 pela Fundação Renova, sendo alvo de muitas reclamações dos atingidos alegando erros por parte da empresa contratada na confecção dos cadastros/formulários.
Jornal Folha1 – E sobre a repactuação, o que os atingidos podem esperar? E quando poderemos ter novidades?
Benilde Madeira – A repactuação está a cargo do Conselho Nacional de Justiça. Acho que no final de junho já poderemos ter alguma novidade, mas lutamos, atualmente, para as Comissões de Atingidos serem ouvidas no processo.
Jornal Folha1 – Surgiu recentemente um suposto documento que fala em recebimentos de novos valores entre R$ 130 mil e R$ 180 mil para impactados…
Benilde Madeira – Sim, todos viram isso mas não se trata de documento oficial, ninguém se responsabiliza por nada disso. Portanto, trata-se de uma atitude que só tumultua e cria falsas expectativas.
Mas tenho muita esperança que a repactuação vai trazer algo novo, uma reparação mais ampla aos atingidos elegíveis, cujos valores é muito difícil citar aqui. Eu defendo sim, uma complementação indenizatória e o retorno do AFE, uma vez que nosso rio Doce ainda carece de recuperação e condições seguras para o consumo do peixe. Esta luta ainda vai longe.
Jornal Folha1 – Na sua opinião a repactuação sai logo?
Benilde Madeira – É muito difícil precisar. Eu falei em final de junho, mas pode haver nova prorrogação do prazo. A repactuação é muito complexa, porque envolve interesses dos governos de Minas Gerais e do Espírito Santo, atuação de muitas entidades e nós, atingidos, também queremos ser ouvidos porque temos reivindicações importantes. As Comissões dos Atingidos querem inclusive ir a Brasília para uma reunião com o CNJ, que vai ser agendada brevemente, se Deus quiser.
Mas tenho muita esperança que a repactuação vai trazer algo novo, uma reparação mais ampla aos atingidos elegíveis, cujos valores é muito difícil citar aqui. Eu defendo sim, uma complementação indenizatória e o retorno do AFE, uma vez que nosso rio Doce ainda carece de recuperação e condições seguras para o consumo do peixe. Esta luta ainda vai longe.
Parabéns pela sua atitude? Eu acredito quem fez entrevista e colocou seus núcleo familiares também era para ser visto como dependente ? Para quer teve então entrevista lá está todo nosso dados
Parabéns a Benilde Madeira,por ser atuante na causa,e por defender os atingidos,agora deu prá entender o que está acontecendo, e que a empresa vem fazendo o seu papel, e indenizando os atingidos, e que também merece o nosso apoio.